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quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Madrugada Saudosista

 Aviso: Paciência na leitura, eu tinha muito a escrever.

  Sempre há o que ser escrito sobre saudade.
  Há um tempo uma leitora me perguntou o porquê de eu não escrever muitos textos nos quais eu, Gabriel G. Filpi, me demonstrasse como um ser humano normal, com meus problemas e defeitos, com meus sonhos e qualidades. Minha escrita, minha cara, respondi, não é bem assim. Não gosto de me expor muito, de me colocar em linhas numa nuvem virtual onde todos possam ler. Prefiro expor meus pensamentos, sonhos, defeitos  e problemas na minha poesia, na minha ficção, que é grande, minúscula, rebuscada, simplista ou elaborada dependendo unicamente de minha disposição na hora da escrita. Coisa de criação mesmo. Prefiro deixar reticências para que quem leia possa deduzir ou imaginar ou completar de sua forma, pintar com suas próprias cores, como uma gravura num livro infantil que cada um colore do jeito que bem entender. Talvez por isso alguns me elogiem muito, por eu, como escritor, não impor exatamente minhas ideias e sempre deixar espaços pra interpretação.
  Mas, ao revirar uns papéis velhos aqui em casa, só por questão de reorganização, decidi abrir alguns cadernos antigos, pra completar a completa inquietação que eu sentia durante todas essas semanas. E foi uma emoção interessantíssima a cada página que eu virava. Submergi de tal forma no passado que não vi as horas se destilarem na minha frente. A saudade foi tanta...! Me pus a pensar tanta coisa...! 
  De início, vi a prepotência de um rapaz de 18 anos que se vê como muito experiente, como muito mutável. Vi que minha essência sempre esteve aqui e que no fundo, não mudou muito não. Prepotência de gente jovem. Acho que é assim mesmo. Quantas pessoas escreveram (em acrósticos tortos, rimas pobrezinhas, rápidas e apressadas e pequenos textos escritos em letra grande para preencher logo o espaço pedido por aquele insistente garoto, em caneta Bic ou canetinha colorida ou lápis de escrever), no caderninho de mensagens que fiz ao pensar que ia mudar de escola, em 2009 - veja bem, não tanto tempo assim - sobre um menino "maluco", ou "confidente" ou "amigo"? É assim que sou hoje, é assim que sempre fui. Essa essência da gente é inata. 
  Depois, parei pra pensar e vi que realmente sou ser único e experiente - em alguns aspectos meus - e mutável. Todos somos assim. Eu, particularmente, sou, mais do que tudo, mutável. Prefiro deixar alguns aspectos de mim pros de estimo, mas isso é visível aos de convivência. É bom mudar. É bom viver intensamente. Dolorido, mas libertador e inspirador. (por "intensamente" não quero dizer necessariamente drogar-se, alcoolizar-se. Quero dizer apenas viver intensamente. Fazer das alegrias grandes alegrias, das dores grandes dores. Tem mais cor, mais magia. Sem contar que somos seres em constante construção e desconstrução, é necessária essa mudança, essa aquiescência quando, numa discussão lhe faltam argumentos, de ver que o outro pode estar certo e reorganizar seus conceitos. Deixe a Cyrus ser a ela de hoje, a de ontem foi ontem.
  Houveram também, no caderninho, várias promessas e desejos de eternidade da amizade e do sentimento. A considerar que parte daquelas pessoas eu nem sequer vi no outro ano e boa parte eu nem sequer fui próximo em época alguma, a gente pensa na efemeridade e na marcação de cada momento. Ali, elas realmente desejavam que fosse eterno. E, se pensar bem, quando dizemos qualquer um "para sempre", não estamos nos referindo precisamente à pessoa, mas ao sentimento e à construção (ou desconstrução) que ela nos proporcionou. Isso pode sim ser eterno, ainda que você não se recorde todos os dias dessas pessoas. É triste pensar que, se já sinto saudade de tempos passados, no futuro terei muito mais tempos passados pra sentir saudade. Mas vá lá, é assim mesmo. Digo isso sempre: as redes sociais e a internet geram a falsa sensação de que você vai continuar próximo de todos os seus amigos atuais durante o resto da vida, mas nunca é assim. Agora que já temos uns bons 10 anos atividade virtual acessível a todos no Brasil, podemos muito bem perceber isso. E não adianta tentar mudar! A beleza da vida está aí também.
  O que proponho a quem me lê apenas uma coisa, depois desse desabafo que com certeza é porque li excessivamente Rubem Alves e Lorena Ely; um dia, quando a disposição bater - eu sei o quanto é raro hoje em dia - e o sol estiver brilhando ou a noite estiver indo longe... revire suas gavetas! Pare um pouquinho no meio dessa vida que exige rapidez a todo momento, até pra rolar pra baixo as páginas - inclusive, se me leu até aqui, obrigado e, por favor, comente comigo a respeito - e ache suas relíquias de vida... sempre há um papelzinho que a gente guarda e se esquece que vai te trazer uma dose de passado que desce queimando a garganta, mas que dá uma sensação tão boa, um saudosismo tão gostoso. Mas cuidado... brincar com passado é perigoso: pegue uma corda, amarre uma ponta na cintura e a outra nas coisas boas do seu presente, que é pra não se afogar.
  Sempre há o que ser escrito sobre saudade.

(...)
  

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Cor

Fotografia por Diego Sanches
A dança deixa fitas
que duram quatro estações
e o menino descobre nelas
leveza e cor.

E dançando-as no ar,
impelido do sentir onipresente,
tem vislumbre de possibilidade
de sorrir seu riso.

E dançando-as no ar,
como vento de Agosto,
observa e espera,
sorri e irradia.

E é calor e esperança
assim que se verbaliza
no quente sol matinal
agraciado pelo batuque.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Querida


  Sabe, amor, aquela nossa almofada? A que o cachorro rasgou. Ela está no lixo. Mas aquele momento nosso, aquela luz que pareceu aparecer enquanto nos beijávamos, logo depois que compramos a almofada, com todas aquelas pessoas ao nosso redor... Ainda está tudo guardado em mim. Sinceramente, estou cada vez mais retraído, mais triste. É difícil. É inconsciente. É culpa da gente.
  Uma vez disse que o fim não importava, que a melhor parte era o meio, o caminho. Retiro o que disse. O fim importa. O fim é um limite chato. Se for fim de fato, vai querer dizer certeza. O ponto final torna-se algoz cruel. Adaptar-se será possível, mas difícil. Tropeço, arrasto... E assim a gente tenta seguir.
  Ao sair do cinema, naquela noite, eu só queria te abraçar. Agora prefiro falar coisas sem sentido... Pra mim fazem sentido. Guardei em mim o seu sorriso, e ele ilumina-me às vezes. Espero que o fato de eu ter colocado o seu nome no hamster que comprei não tenha te ofendido.
  É que a fenda no meu coração é grande. Até a poesia cai ali... 
 E nem todas as palavras que você gostava podem fazer uma ponte agora. É preciso ser essa coisa dramática? Pensar que era ontem que sonhávamos um filho. Brincávamos. Agora a gente cresceu e as obrigações do dia-a-dia diminuem cada vez mais a chance da gente se encontrar. O acaso não é mais nosso deus. Hoje, usamos óculos absurdos e suamos para ir ao banheiro. É, sempre tive medo que a rotina nos acabasse.
  Fui feliz com você. Juro que sim. Acho que a felicidade se foi junto com você. Ademais, duvido que haja algo que não seja finito.
  Olhe para mim, querida. Não deixe-me sofrer assim. Que essa água que sai do meu olho agora não seja em vão. E pensar que todas aquelas vezes antes eu fingi sentir dor. 
  Estávamos interrompendo a luz do outro tanto assim? Vou me rasgar. Se rasgue comigo. Alimentemo-nos com muita cautela. Dizem que o corpo é importante.
  Não pouse em vão nunca, amor, não brinque com o previsto.